No condomínio Brasil moradores da cobertura pagam as menores taxas

Juracy Braga Soares Junior
Publicado em: seg, 01/03/2021 - 13:17

As pessoas mais ricas do Brasil pagam menos impostos – proporcionalmente à renda – do que os mais pobres. As maiores empresas que operam no país também; pagam menos tributos – proporcionalmente ao seu faturamento – do que as médias empresas. Em ‘tributês’ essa configuração que o nosso Sistema Tributário adota e aperfeiçoa é chamada de ‘Regressividade Tributária’. Em bom português significa injustiça fiscal.

Este artigo está escrito em português para que qualquer pessoa que jamais estudou Contabilidade ou Direito Tributário entenda como o país construiu seu modelo de cobrança de tributos junto à sua população. E somos nós quem financiamos tudo o que você vê à sua volta. Estradas; pontes; viadutos; escolas; hospitais; vacinas; salários de médicos, de juízes, deputados, desembargadores, policiais, professores; do combustível que move as viaturas policiais e ambulâncias do SAMU até aquele que movimenta o caminhão de lixo que passa na sua rua; tudo isso é mantido pelo seu dinheiro, que é entregue ao Estado (União, Estados e Municípios) em forma de tributos (impostos, taxas e contribuições).

Sim, mas a expressão ‘somos todos nós’ deve ser então relativizada. Como nossas regras tributárias acabam privilegiando os mais ricos, isso significa que a carga tem que ser suportada por quem? Acertou! Pelos mais pobres! No Brasil, quanto mais rico você for, menos imposto vai pagar. E o inversamente proporcional também é verdadeiro: quanto mais pobre, mais tributos – proporcionalmente à renda – o brasileiro tem que pagar.

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O Estado pode cobrar tributos sobre o que achar conveniente. Se o Estado decidir cobrar imposto pelo fato de você possuir uma TV em sua casa, pode sim. É exatamente isso que o Estado faz quando está cobrando o IPVA, que é o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores. Então, da mesma forma que cobra imposto porque você possui um veículo na garagem, poderia decidir cobrar pelo simples fato de você possuir uma TV. E cobraria por cada TV instalada.

No Brasil, os principais tributos são distribuídos em três grandes áreas: Renda; Consumo e Patrimônio. Como exemplos desses tributos, podemos indicar, por exemplo, sobre a Renda: Imposto de Renda, que fica com a União; sobre o Consumo: ICMS (Estados e DF) + ISS (Municípios e DF) + IPI (União) + PIS e CONFINS (União); e Patrimônio: ITR (União); IPVA (Estados) e IPTU (Municípios). São só esses? Não! Mas vamos deixar só esses - que são os mais expressivos e termos de arrecadação – para ilustrar nossa mensagem.

BRASIL SOBRECARREGA TRIBUTAÇÃO SOBRE CONSUMO
Ocorre que - como o Brasil concentra a tributação no consumo em vez da renda - e como os mais pobres aplicam mais de 60% de sua renda com alimentação (1) – leia-se, consumo - a consequência direta dessas regras é que a cobrança de impostos no Brasil acaba privilegiando os mais ricos.

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E como é essa distribuição nos demais países? A seguir reproduzimos figura constante do estudo “A Reforma Tributária Necessária – ANFIP” (2).

Observe que a média dos países que compõem a OCDE (3) tributam a renda em 34,1%, enquanto no Brasil esse percentual cai para 18,3%. A situação se inverte quando o assunto é tributação sobre o consumo. Nos demais países a média fica no patamar de 32,4%, subindo para 49,7% no modelo brasileiro. O Brasil se aproxima mais quando comparamos a tributação sobre o patrimônio. Contudo, o percentual tributa – por aqui - ainda é inferior à média da OCDE.

Essa comparação acima já aponta para a distorção em nosso modelo tributário. Isso explica a alta carga tributária que carregam nossos produtos e serviços. O modelo não é só ruim por desestimular a produção interna, mas – também e principalmente – por penalizar duramente os mais pobres, que direcionam a maior parte de seus ganhos para o consumo.

Se analisarmos a realidade de tributação da renda de modo mais ampliado, observamos que o Brasil está – também nesse aspecto – desalinhado com os países que desenvolveram os respectivos sistemas tributários de forma mais progressiva, privilegiando o financiamento do Estado a partir da tributação da renda.

BRASIL TRIBUTA MENOS A RENDA
Esse é o panorama, ainda conforme o estudo “A Reforma Tributária Necessária – ANFIP”.

É possível, portanto, concluirmos que nossa modelagem tributária que carrega tributos sobre a renda não está só atrás da média da OCDE, que variou de 43,3% para 41,0%. Mas também ficamos atrás da realidade dos demais países da América Latina, que modularam alíquotas entre 32,1% a 31,6%. O Brasil ‘desponta’ com uma tributação fixa em 27,5%, enquanto a média mundial é de 31,3%.

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OS ‘CONDÔMINOS’ DA COBERTURA PAGAM AS MENORES ‘TAXAS CONDOMINIAIS’
Pelo que ficou demonstrado acima, resta claro que o sistema não é só complexo. É – principalmente – injusto para com os brasileiros que menos ganham. O país fez a opção por se sustentar primordialmente com o resultado de tributos cobrados no consumo.

E, como o pobre só tem renda para custear basicamente a sua subsistência, é evidente que a base da pirâmide (mais pobre) financia majoritariamente o custo do Estado. Estudo da OSFAM repercutido pelo El País (4) em 2017 apontou que apenas seis bilionários brasileiros detinham riqueza igual à metade mais pobre da população brasileira. A mesma pesquisa indicou o fato mais grave: Os brasileiros que correspondem à parcela dos 5% mais ricos possuem total de renda igual aos demais 95%.

Esses dados posicionam o Brasil na sétima colocação dentre os países mais desiguais do mundo, perdendo apenas para países africanos.

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CAMINHOS PARA A RECALIBRAÇÃO DO SISTEMA
Neste breve ensaio não vamos examinar as disfuncionalidades de nosso Sistema Tributário, como o excesso de regras e exceções, além das decisões judiciais que interferem demasiadamente na legislação, impondo um custo extra à sociedade, sem gerar riqueza.

Mas, se pudéssemos apontar as principais diretrizes para a reforma de nossa plataforma tributária, nos apoiaríamos nesses indicadores acima listados, como algo no qual temos que nos espelhar. Duas decisões prioritárias seriam:

  • Transferência de parte da carga tributária do consumo para a renda;
  • Tributação de lucros e dividendos;

Infelizmente o que vemos em discussão – no Congresso Nacional – em termos de propostas para um novo modelo tributário não privilegia essa remodelagem necessária. As duas principais propostas visam – prioritariamente – fundir tributos e simplificar regras de conformidade fiscal. Ou seja, o foco é melhorar o ambiente para as empresas. Isso é importante, mas é pouco para levar o país em direção a um sistema que distribua melhor a renda e seja justo, cobrando mais de quem tem mais, ao invés de fazer exatamente o contrário.

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Prof. Juracy Soares - e-mail: juracy.soares@unieducar.org.br
Fundador da Unieducar Universidade Corporativa. Doutor em Direito; Mestre em Controladoria; Especialista em Auditoria; Graduado em Direito e Contábeis. Certificado em Docência do Ensino Superior; Pesquisador em e-Learning. Editor-Chefe da Revista Científica Semana Acadêmica. Professor universitário e palestrante internacional. Escritor, autor do livro Enriqueça Dormindo.

 

REFERÊNCIAS:

  1. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/08/brasileiro-usa-auxilio-eme...
  2. https://www.anfip.org.br/?mdocs-file=8599
  3. https://pt.wikipedia.org/wiki/Organiza%C3%A7%C3%A3o_para_a_Coopera%C3%A7...
  4. https://brasil.elpais.com/brasil/2017/09/22/politica/1506096531_079176.html
  5. https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2019/12/09/br...

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